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segunda-feira, 5 de maio de 2008

Trecho (:



(...)
As pessoas são aquilo que elas viveram. São cada detalhe experimentado, desde o primeiro instante em que há vida no útero, e esta vida é você. Dizem que o lugar é quentinho, escurinho. Bolas, então é horrível! É horrível ficar trancafiado nove meses num lugar escurinho e quentinho, trata-se do inferno claustrofóbico. Aí já se nasce agoniado. E morrendo de culpa, porque dizem que, da barriga, o neném escuta tudo, sente tudo, entende tudo. Então você entendeu que mamãe estava péssima, tendo enjôos e se achando, com razão, pavorosa. Que papai tinha raiva de você, porque não podia mais agarrar a esposinha linda - outrora havia sido linda - e entrar dentro dela, porque você estava lá. Que ele estava puto da vida, porque queria sair, ir até uma boate, comer num rodízio de camarão, mas ela estava com sono, com gases, com pés inchados, azia e má digestão. Você soube de tudo isso. Eles bem que tentaram evitar que você escutasse todas as reclamações, colocavam música clássica pra você. Papai até beijava a barrigona de mamãe, conversava com o feto lá dentro, dizia amar o feto; as pessoas têm boa vontade. E de mais a mais não há outro jeito - a humanidade deve seguir a sua sina. É assim. Talvez o bebê de proveta desenvolva outros traumas, que não estes. É isso: não há como evitar os traumas. Há como sobreviver a eles, nunca como deixar de tê-los.

( Fernanda Young ;D )

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